Desde o início dos anos 70 já haviam propostas de revisão do código civil de 1916. Interessante lembrar as observações feitas pelo prof. Miguel Reale na mensagem n. 160 de 10 de junho de 1975 (http://200.251.3.5/download/codigocivil.pdf) sobre o projeto de revisão do código civil brasileiro, projeto que aliás consegui manter em sua forma original o artigo 421 do CC/2002.
Na mesma mensagem o então Ministro da Justiça, Armando Falcão, assim se expressa com relação ao projeto:
"Atualizar, todavia, o Código vigente, não só para superar os pressupostos individualistas que condicionaram a sua elaboração, mas também para dotá-lo de institutos novos, reclamados pela sociedade atual, nos domínios das atividades empresárias e nos demais setores da vida privada." (pag. 20)
e
"É de longa data, Senhor Presidente, que vem sendo reclamada a atualização do Código Civil de 1916, elaborado numa época em que o Brasil mal amanhecia para o surto de desenvolvimento que hoje o caracteriza, e quando ainda prevaleciam, na tela do Direito, princípios individualistas que não mais se harmonizam com as aspirações do mundo contemporâneo, não apenas no domínio das atividades empresariais, mas também no que se refere à organização da família, ao uso da propriedade ou ao direito das sucessões." (pag. 22)
Para mim o uso (ou a intenção de pensar assim) "pressupostos individuais" e "princípios individuais" utilizado pelo Ministro, mostra uma vontade latente de se ter uma visão social das relações contratuais.
Em suas exposições de motivos na mesma mensagem Miguel Reale assim definiu a necessidade um código pautado nas relações sociais coletivas:
"Superado de vez o individualismo, que condicionara as fontes inspiradoras do Código vigente, reconhecendo-se cada vez mais que o Direito é social em sua origem e em seu destino, impondo a correlação concreta e dinâmica dos valores coletivos com os individuais, para que a pessoa humana seja preservada sem privilégios e exclusivismos, numa ordem global de comum participação, não pode ser julgada temerária, mas antes urgente e indispensável, a renovação dos códigos atuais, como uma das mais nobres e corajosas metas de governo." (pag. 25-26)
Com isso eu creio que o artigo 421 não foi um "acidente" ou uma intenção apenas benevolente da vontade dos legisladores, mas sim uma clara intenção de se fazer - diria mesmo forçar - uma relação não mais meramente comercial das relações sociais, que segundo Rawls são essencialmente relações contratuais, mas fazer com que o contrato tenha efetivamente validade social.
Se é verdade então que o código civil de 2002 já tinha em seu DNA a questão social, se já se preocupava-se e se tinha esta visão de que privilegiar o coletivo em detrimento ao individual se fazia necessário. Porque da polêmica entorno do artigo 421, ao ponto de até mesmo o deputado, na época, Tancredo Neves, solicitar a modificação do texto original? (Liberdade de Contratar - Limites Impostos Pela Função Social do Contrato de autoria do Ministro do TST José Luciano de Castilho Pereira em http://www.tst.gov.br/ArtigosJuridicos/GMLCP/LIBERDADEDECONTRATAR.pdf, pag. 5)
O próprio Miguel Reale na exposição de motivos do projeto de reforma do Código Civil nos fornece uma pista para a resposta.
"Não é sem motivos que reitero esses dois princípios, essencialmente complementares, pois o grande risco de tão reclamada socialização do Direito consiste na perda dos valores particulares dos indivíduos e dos grupos; e o risco não menor da concretude jurídica reside na abstração e olvido de características transpessoais ou comuns aos atos humanos, sendo indispensável, ao contrário, que o individual ou o concreto se balance e se dinamize com o serial ou o coletivo, numa unidade superior de sentido ético." (pag. 35)
Aqui vemos que a questão ética permeia uma necessidade social, na opinião do legislador. Mas também podemos perceber que não basta uma motivação ética, pois as questões econômicas podem, e na maioria das vezes é assim, definir os ditames da Lei.
Eu ainda sou do tempo em que não se falava em Código de Defesa do Consumidor, e em que as relações sociais e familiares ainda eram regidas pelas regras (CC de 1916) do início do século XX.
Naturalmente, no dias de hoje, para um jovem de 20 anos uma questão como ter direitos na compra e venda, de "colocar no pau" um fornecedor ruim é absolutamente normal, está arraigado no senso comum. Mas nem sempre foi assim. E isso se justifica, pois as épocas mudam, os valores mudam a ética muda e com ela a questão social.
Hoje, no Direito do Trabalho, acusa-se a intervenção legislativa como
causa do desemprego, e continuam pregando que o negociado deve prevalecer sobre o legislado e que o negociado deve ser cumprido. São as razões do lobo justificando o “pacta sunt servanda”, com a transformação do Direito do Trabalho em ramo secundário – quase descartável – do Direito Econômico. (Liberdade de Contratar - Limites Impostos Pela Função Social do Contrato de autoria do Ministro do TST José Luciano de Castilho Pereira em http://www.tst.gov.br/ArtigosJuridicos/GMLCP/LIBERDADEDECONTRATAR.pdf, pag. 10)
Certamente para as novas gerações com valores e conquistas sociais mais arraigadas o "pacta sunt servanda" não pode viver em comunhão com o que Bobbio chamou de "O Estado de Direito é o Estado dos Cidadãos!"
Na mesma mensagem o então Ministro da Justiça, Armando Falcão, assim se expressa com relação ao projeto:
"Atualizar, todavia, o Código vigente, não só para superar os pressupostos individualistas que condicionaram a sua elaboração, mas também para dotá-lo de institutos novos, reclamados pela sociedade atual, nos domínios das atividades empresárias e nos demais setores da vida privada." (pag. 20)
e
"É de longa data, Senhor Presidente, que vem sendo reclamada a atualização do Código Civil de 1916, elaborado numa época em que o Brasil mal amanhecia para o surto de desenvolvimento que hoje o caracteriza, e quando ainda prevaleciam, na tela do Direito, princípios individualistas que não mais se harmonizam com as aspirações do mundo contemporâneo, não apenas no domínio das atividades empresariais, mas também no que se refere à organização da família, ao uso da propriedade ou ao direito das sucessões." (pag. 22)
Para mim o uso (ou a intenção de pensar assim) "pressupostos individuais" e "princípios individuais" utilizado pelo Ministro, mostra uma vontade latente de se ter uma visão social das relações contratuais.
Em suas exposições de motivos na mesma mensagem Miguel Reale assim definiu a necessidade um código pautado nas relações sociais coletivas:
"Superado de vez o individualismo, que condicionara as fontes inspiradoras do Código vigente, reconhecendo-se cada vez mais que o Direito é social em sua origem e em seu destino, impondo a correlação concreta e dinâmica dos valores coletivos com os individuais, para que a pessoa humana seja preservada sem privilégios e exclusivismos, numa ordem global de comum participação, não pode ser julgada temerária, mas antes urgente e indispensável, a renovação dos códigos atuais, como uma das mais nobres e corajosas metas de governo." (pag. 25-26)
Com isso eu creio que o artigo 421 não foi um "acidente" ou uma intenção apenas benevolente da vontade dos legisladores, mas sim uma clara intenção de se fazer - diria mesmo forçar - uma relação não mais meramente comercial das relações sociais, que segundo Rawls são essencialmente relações contratuais, mas fazer com que o contrato tenha efetivamente validade social.
Se é verdade então que o código civil de 2002 já tinha em seu DNA a questão social, se já se preocupava-se e se tinha esta visão de que privilegiar o coletivo em detrimento ao individual se fazia necessário. Porque da polêmica entorno do artigo 421, ao ponto de até mesmo o deputado, na época, Tancredo Neves, solicitar a modificação do texto original? (Liberdade de Contratar - Limites Impostos Pela Função Social do Contrato de autoria do Ministro do TST José Luciano de Castilho Pereira em http://www.tst.gov.br/ArtigosJuridicos/GMLCP/LIBERDADEDECONTRATAR.pdf, pag. 5)
O próprio Miguel Reale na exposição de motivos do projeto de reforma do Código Civil nos fornece uma pista para a resposta.
"Não é sem motivos que reitero esses dois princípios, essencialmente complementares, pois o grande risco de tão reclamada socialização do Direito consiste na perda dos valores particulares dos indivíduos e dos grupos; e o risco não menor da concretude jurídica reside na abstração e olvido de características transpessoais ou comuns aos atos humanos, sendo indispensável, ao contrário, que o individual ou o concreto se balance e se dinamize com o serial ou o coletivo, numa unidade superior de sentido ético." (pag. 35)
Aqui vemos que a questão ética permeia uma necessidade social, na opinião do legislador. Mas também podemos perceber que não basta uma motivação ética, pois as questões econômicas podem, e na maioria das vezes é assim, definir os ditames da Lei.
Eu ainda sou do tempo em que não se falava em Código de Defesa do Consumidor, e em que as relações sociais e familiares ainda eram regidas pelas regras (CC de 1916) do início do século XX.
Naturalmente, no dias de hoje, para um jovem de 20 anos uma questão como ter direitos na compra e venda, de "colocar no pau" um fornecedor ruim é absolutamente normal, está arraigado no senso comum. Mas nem sempre foi assim. E isso se justifica, pois as épocas mudam, os valores mudam a ética muda e com ela a questão social.
Hoje, no Direito do Trabalho, acusa-se a intervenção legislativa como
causa do desemprego, e continuam pregando que o negociado deve prevalecer sobre o legislado e que o negociado deve ser cumprido. São as razões do lobo justificando o “pacta sunt servanda”, com a transformação do Direito do Trabalho em ramo secundário – quase descartável – do Direito Econômico. (Liberdade de Contratar - Limites Impostos Pela Função Social do Contrato de autoria do Ministro do TST José Luciano de Castilho Pereira em http://www.tst.gov.br/ArtigosJuridicos/GMLCP/LIBERDADEDECONTRATAR.pdf, pag. 10)
Certamente para as novas gerações com valores e conquistas sociais mais arraigadas o "pacta sunt servanda" não pode viver em comunhão com o que Bobbio chamou de "O Estado de Direito é o Estado dos Cidadãos!"
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