Pular para o conteúdo principal

RESENHA: Culpa in Contrahendo ou Indenização em Contratos Nulos ou não chegados à Perfeição – Rudolf von Jhering

No universo da responsabilidade civil me parece que ainda existem alguns casos “mal resolvidos”, dentre eles o de saber se há responsabilidade contratual numa pré-negociação ou numa negociação entre entes privados.

Muitas são as opiniões acerca deste tema, mas a maior parte delas caminha para duas alternativas: existe a culpa e ela é contratual ou existe culpa, mas ela não é contratual.

Pesquisando em alguns manuais de Direito Civil que tratam da questão dos contratos pude observar que várias são as justificativas para se seguir um ou outro caminho, mas no que tange a jurisprudência, assim me parece, a maioria aplica a responsabilidade contratual aos negócios jurídicos, mesmo que eles não tenham chego à perfeição. Mas nenhum deles, apesar das justificativas, se refere às fontes para justificar tal ou qual caminho para a responsabilidade civil no caso de culpa numa relação privada que não culminou efetivamente num contrato.

A uma responsabilidade civil com culpa numa relação privada onde as partes estavam em negociação, porém não se concretizou o negócio jurídico seguindo os cânones contratuais da-se o nome de culpa in contrahendo.

E foi justamente na obra de uma dos mais celebrados doutrinadores do direito que fui encontrar algum subsídio para a fonte da culpa in contrahendo. Estamos falando de Rudolf von Jhering e a obra Culpa in Contrahendo ou indenização em contratos nulos ou não chegados à perfeição, publicado pela Editora Almedina em 2008.[1]

A obra preza pela clareza e simplicidade. A genialidade de Jhering lhe permite explorar um tema complexo explorando as fontes romanas em busca de uma justificativa para uma indenização numa negociação que se torna nula ou que não chega a perfeição.

Depois de discorrer sobre as fontes romanas e de analisar alguns casos concretos a título de exemplo, a conclusão de Jhering sobre uma culpa num negócio jurídico imperfeito  “é a ação  contratual”.[2]
Para Jhering, mesmo que não tenha havido um contrato a indenização (ou a sua justificativa para a indenização) deve se dar como se um contrato houvesse. Ainda afirma o doutrinador alemão:

“A culpa in contrahendo não é mais do que a culpa contratual numa direção específica.”[3]

Vale lembrar que o nosso Código Civil de 2002 não trata da questão das negociações antes do contrato.[4]
Apesar do forte poder de influência que uma autoridade como Jhering  tem, mesmo ele não ficou imune às críticas de sua época por conta desta doutrina.

A mais séria diz respeito ao fato mesmo das fontes romanas, pois dá a impressão de que Jhering “cavou” um justificativa para sua doutrina com base nas fontes romanas, mas o fato é que o termo culpa in contrahendo não aparece nos textos e fragmentos de direito romano que chegaram até nós.

Seja como for, é extremamente importante a todos os operadores de direito que lidam com questões contratuais travarem conhecimento com este texto de Jhering, pois ele além de elucidar vários aspectos das relações contratuais e os eventuais dolus que ocorrem a partir destas relações, também nos mostra o método investigativo e o rigor da argumentação de Jhering. Uma verdadeira opus da doutrina do direito privado.





[1] Antes de comentar a luz que esta maravilhosa lâmpada que é o livro de Jhering, permitam-me um desabafo. Este desabafo vai na  esteira da apresentação da obra feita por Paulo Mota Pinto. Ele alerta que está é a primeira tradução para o português da obra escrita por Jhering em 1861 , e não se trata de uma “obra obscura” de Jhering dada a complexidade do assunto e a repercussão que o tema trouxe mesmo na época de Jhering. Por fim, com tantos doutrinadores versados em alemão deixar passar mais de 140 anos para termos a obra em português me parece um absurdo.
[2] P. 43
[3] P. 41
[4] pre-contrato não é negociação contratual.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

RESENHA: A Arte da Prudência

Muitos são os livros que dão conselhos e que procuram nos indicar os melhores caminhos a seguir no que diz respeito a nossa forma de agir e de lidar com as pessoas. Muita divagação e pouca objetividade é o que mais vemos nas prateleiras das livrarias que possam tratar deste tema: relações interpessoais. É muito “achismo”, muita opinião subjetiva e há ainda aqueles que falam aquilo que acreditamos ser o óbvio. Fico impressionado de observar a grande quantidade de títulos que procuram associar a figura de um grande personagem histórico ou então de um livro às questões de ordem empresarial, porém de forma pouco lapidada, apenas chamativa. Exemplos do que estou querendo ilustrar são: Napoleão CEO, Madre Teresa CEO, A Arte da Guerra nos Negócios etc. Tudo no sentido de ilustrar novas estratégias ou então receitas rápidas de como ganhar dinheiro etc. Eu penso que o sucesso destas obras está ligado diretamente à bruma de mistério e ignorância que estas personagens e suas obras c...

Resenha: Estética, literatura e formação humana: um diálogo entre Honoré de Balzac e György Lukács

  Resenha Livro: Estética, literatura e formação humana:  um diálogo entre Honoré de Balzac e György Lukács Autora: Lenha Aparecida Silva Diógenes Editora: Caipora, Marília - SP Ano de publicação: 2020   A literatura, geralmente, é fonte de pesquisa e análises que possibilitem identificar  possíveis conexões entre o autor sua obra e a realidade. Qual realidade? A autora aborda os problemas envolvendo o debate aceda do realismo versus expressionismo cada um descrevendo a realidade social a sua maneira fazendo a crítica da falseabilidade do cotidiano pelo capitalismo. A autora também apresenta o  realismo socialista que por fim não se concretizou, ou então foi deturpado como forma de propaganda do regime de Stálin. Neste cenário de realismo literário surgem dois gigantes da genialidade humana: Balzac [1] e Lu...