Pular para o conteúdo principal

O significado de aval

Considerando o contexto em que uma sociedade limitada pode ou não ser avalista em uma obrigação cambial, cabe um esclarecimento quanto ao significado de aval.
A definição de aval segundo o (Houaiss, 2009, pag. 227):
“assinatura lançada em título de crédito, pela qual o assinante se compromete a garantir as obrigações de outra pessoa que figure no documento.”
Por esta definição do Houaiss verifica-se que aval é uma ação (assinatura lançada) em um determinado tipo de documento (título de crédito). Esta ação de assinar um título de crédito gera uma obrigação por parte de quem assinou o título para garantir as obrigações de outrem perante terceiro.
Esta obrigação está positivada através do artigo 897 de nosso atual ordenamento civil:
Art. 897. O pagamento de título de crédito, que contenha obrigação de pagar soma determinada, pode ser garantido por aval.
Outro importante destaque deve se atribuir ao aval: aval não tem as mesmas características de um endosso ou de um fiador.
O aval é um garantidor integral da obrigação perante terceiro. Segundo (Acquaviva, 2010, 4ª ed., pag. 129):
“O aval não se confunde com o endosso ou com a fiança. Não se confunde com o endosso porque, neste, o endossante é parte do título, proprietário que transfere a propriedade a outrem; e nem com fiança se confunde porque está é obrigação subsidiária, já que o fiador responde apenas quando o afiançado não cumpre a sua obrigação, ao passo que, mediante o aval, o avalista torna-se codevedor, em obrigação solidária, e o pagamento  da obrigação pode imputado diretamente a ele, sem que seja, anteriormente,contra o avalizado.”
Destarte, observa-se que o aval tem um significado jurídico muito mais forte, no que tange a obrigação, do que o endosso e a fiança.
Se a fiança nas relações e/ou transações comerciais e/ou contratuais, é um instituto que vem perdendo sua força por conta das dificuldades e implicações “psicológicas” que ser fiador de alguém contém, o instituto aval é muito mais vinculante.
Tendo esta perspectiva de que o aval é muito mais vinculante resta saber se uma sociedade limitada pode assumir esta obrigação frente a terceiros e de como, se for este o caso, a sociedade deve se precaver para não ser avalista em obrigações cambiais, por exemplo.
A sociedade limita que pretende restringir suas obrigações de aval, deve incluir esta restrição claramente em seu contrato social, cabendo ao avalizado e o terceiro tomar ciência de que à sociedade é vetado, explicitamente, o uso do instituto de aval.
Outro aspecto que deve ser observado é se a sociedade é administrada por terceiro estranho à sociedade.
Tecnicamente o administrador é o responsável pela gestão da sociedade e pode assumir obrigações frente a terceiros. Neste sentido deve-se atentar ao artigo 1.015 do Código Civil de 2002.
O caso em que a sociedade é administrada por terceiro não sócio, faz-se necessário à luz do artigo 1.015 do código civil limitar as responsabilidades do administrador deixando claro que ele não poderá assumir o compromisso de aval frente a terceiros em nome da sociedade. Esta restrição deverá ser averbada na junta comercial para que se dê publicidade a esta restrição.
O aval é uma garantia do título, da obrigação assumida e não do avalizado. O que se assume no aval é a obrigação e não a pessoa do avalizado, por exemplo, se o avalizado usar de má-fé para realizar alguma transação comercial com terceiro e causar perdas e danos devido esta má-fé, o aval não responde solidaria e nem subsidiariamente com o avalizado, pois ele garante a obrigação de honrar o título assumido frente a terceiro. Para corroborar o argumento veja-se a ementa:
Direito civil, comercial e processual civil. Aval. Alegação de cerceamento de defesa. Erro substancial. Reexame de provas. Dissenso jurisprudencial. Similitude. Não-comprovação. - O aval caracteriza-se como garantia do título e não do avalizado, não importando a causa subjacente. - Para análise de ocorrência de cerceamento de defesa, bem como de erro substancial, necessário seria o revolvimento do conjunto fático-probatório, obstado em sede de recurso especial. - A comprovação da similitude fática dos casos confrontados constitui requisito de admissibilidade do recurso especial. Recurso especial não conhecido. (432163 DF 2002/0000438-0, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 04/04/2005, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 16.05.2005 p. 345)
Para dar azo ao que está positivado no código civil de 2002, artigo 897, pode-se citar também que o BGB também trata de aval praticamente nos mesmos termos em seu artigo 765:
 “Mediante um contrato de garantia, empenha-se o avalista frente ao credor de um terceiro para cumprir a obrigação da parte.”[1] (livre tradução)

A definição de aval no ordenamento alemão é Bürgschaft.

Segundo (Creifelds, 2011, pag. 236), que basicamente é a positivação do artigo 765 do BGB:

“A garantia é um Contrato pelo qual o avalista compromete-se ao credor, para o cumprimento da obrigação de um terceiro (devedor), veja (765 BGB).”[2] (livre tradução)

Referências Bibliográficas
Oliveria, James Eduardo. Código Civil Anotado e Comentado. 2ª Edição. Editora Forence, 2010. Rio de Janeiro.
Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. 1ª Edição. Editora Objetiva, 2009. Rio de Janeiro.
Creifelds, Carl. Weber, Klaus. Rechtswörterbuch. Verlag C.H. Beck, München, 2011.
Palandt, Otto. Bürgerliches Gesetzbuch (BGB). Verlag C.H. Beck, 2012. 71. Auflage.
Acquaviva, Marcus Cláudio. Dicionário Jurídico Acquaviva. 4ª Edição. Editora Rideel. 2010. São Paulo.







[1] 765 (1) Durch den Bürgschaftsvertrag verpflichtet sich der Bürge gegenüber dem Gläubiger eines Dritten, für die Erfüllung der Verbindlichkeit des Dritten einzustehen. O BGB pode ser encontado on-line em: http://www.jusline.de/BGB.html


[2] Die Bürgschaft ist ein Vertrag, durch den sich Bürge gegenüber dem Gläubiger verpflichtet, für die Erfüllung der Verbindlichkeit eines Dritten (Schuldner) einzustehen ( 765 BGB).

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

RESENHA: Culpa in Contrahendo ou Indenização em Contratos Nulos ou não chegados à Perfeição – Rudolf von Jhering

No universo da responsabilidade civil me parece que ainda existem alguns casos “mal resolvidos”, dentre eles o de saber se há responsabilidade contratual numa pré-negociação ou numa negociação entre entes privados. Muitas são as opiniões acerca deste tema, mas a maior parte delas caminha para duas alternativas: existe a culpa e ela é contratual ou existe culpa, mas ela não é contratual. Pesquisando em alguns manuais de Direito Civil que tratam da questão dos contratos pude observar que várias são as justificativas para se seguir um ou outro caminho, mas no que tange a jurisprudência, assim me parece, a maioria aplica a responsabilidade contratual aos negócios jurídicos, mesmo que eles não tenham chego à perfeição. Mas nenhum deles, apesar das justificativas, se refere às fontes para justificar tal ou qual caminho para a responsabilidade civil no caso de culpa numa relação privada que não culminou efetivamente num contrato. A uma responsabilidade civil com culpa numa relaç...

RESENHA: A Arte da Prudência

Muitos são os livros que dão conselhos e que procuram nos indicar os melhores caminhos a seguir no que diz respeito a nossa forma de agir e de lidar com as pessoas. Muita divagação e pouca objetividade é o que mais vemos nas prateleiras das livrarias que possam tratar deste tema: relações interpessoais. É muito “achismo”, muita opinião subjetiva e há ainda aqueles que falam aquilo que acreditamos ser o óbvio. Fico impressionado de observar a grande quantidade de títulos que procuram associar a figura de um grande personagem histórico ou então de um livro às questões de ordem empresarial, porém de forma pouco lapidada, apenas chamativa. Exemplos do que estou querendo ilustrar são: Napoleão CEO, Madre Teresa CEO, A Arte da Guerra nos Negócios etc. Tudo no sentido de ilustrar novas estratégias ou então receitas rápidas de como ganhar dinheiro etc. Eu penso que o sucesso destas obras está ligado diretamente à bruma de mistério e ignorância que estas personagens e suas obras c...

Resenha: Estética, literatura e formação humana: um diálogo entre Honoré de Balzac e György Lukács

  Resenha Livro: Estética, literatura e formação humana:  um diálogo entre Honoré de Balzac e György Lukács Autora: Lenha Aparecida Silva Diógenes Editora: Caipora, Marília - SP Ano de publicação: 2020   A literatura, geralmente, é fonte de pesquisa e análises que possibilitem identificar  possíveis conexões entre o autor sua obra e a realidade. Qual realidade? A autora aborda os problemas envolvendo o debate aceda do realismo versus expressionismo cada um descrevendo a realidade social a sua maneira fazendo a crítica da falseabilidade do cotidiano pelo capitalismo. A autora também apresenta o  realismo socialista que por fim não se concretizou, ou então foi deturpado como forma de propaganda do regime de Stálin. Neste cenário de realismo literário surgem dois gigantes da genialidade humana: Balzac [1] e Lu...